A Ministra dos Esportes, Ana Moser, declarou que os jogos eletrônicos, conhecidos como “esports”, não são vistos como esportes convencionais. De acordo com a ministra, os treinos realizados pelos jogadores de esports se assemelham mais às práticas da indústria de entretenimento, como música e filmes.
“Na minha visão, o esporte eletrônico é uma indústria de entretenimento, não um esporte. Então, você se diverte jogando videogame, é diversão. ‘Ah, mas o pessoal treina para isso’. Treina, assim como um artista treina. Eu disse recentemente que, assim como Ivete Sangalo treina para seus shows, ela não é uma atleta da música”, comentou Moser.
“A questão do esporte eletrônico a nível federal ainda não é uma realidade. Não tenho a intenção de investir nisso. No meu entendimento, isso não é esporte”, afirmou a ministra.
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Sumário
- Mercado de “esports”
- O que dizem os especialistas E-sports são esportes?
- O que dizem os estudos
- O E-sports é para quem?
- Os benefícios do E-sports para as pessoas
- Conclusão
Mercado de “esports”
De acordo com a Newzoo, uma das principais fontes de dados sobre a indústria de games, a audiência dos campeonatos de eSports cresceu de US$ 397,8 milhões em 2019 para US$ 435,9 milhões em 2020.
A empresa projeta que, até 2024, esse público atinja US$ 577,2 milhões. Em 2021, a indústria de eSports já movimentou mais de 1 bilhão de dólares globalmente.
O que dizem os especialistas E-sports são esportes?
A psicóloga Alessandra Dutra, que atua na área de esports e já fez parte do Comitê Olímpico Brasileiro (COB), acredita que os esports podem ser considerados equivalentes aos esportes tradicionais, apesar da falta de consenso.
“Há uma discussão entre especialistas sobre o que define um esporte. Alguns mais conservadores consideram esporte apenas aquilo que envolve esforço físico. No entanto, há uma outra perspectiva que inclui atividades que causam desgaste físico, como games, xadrez, Fórmula 1 e Stock Car. Esports possuem regras, treinamentos, entidades organizadas e campeonatos. Além disso, estamos na era da intersecção entre desempenho e saúde mental, e esse diálogo já ocorre há muito tempo nos esports.”
“O preconceito existe devido à forte associação com o entretenimento. É importante entender que um viciado em jogos nunca alcança o nível profissional. Não consegue suportar a rotina intensa de um gamer profissional, que é muito diferente de alguém jogando por lazer, como comparou a ministra Ana Moser com a cantora Ivete Sangalo,” detalha a especialista.
Claudio Godoi, presidente da Associação Brasileira de Psicologia dos Esportes Eletrônicos (ABRASPEE), também defende a visão de que os esports são esportes:
“O nível de execução física nos esports é um diferencial competitivo, embora diferente dos esportes tradicionais. Nos esports, a coordenação motora fina é predominante. Os esports envolvem raciocínio, estratégia, velocidade, habilidade, destreza, controle emocional, processamento de múltiplas informações simultâneas, comunicação e trabalho em equipe. O atleta precisa estar em pleno funcionamento mental e físico para ter um bom desempenho.”
O professor Ary José Rocco Júnior, da USP, reconhece que a discussão sobre se os esports são ou não esportes é complexa, com diferentes pontos de vista.
“Historicamente, no século 20, esportes eram definidos por regras universais e institucionalização, necessitando de federações ou confederações para organizar competições e garantir igualdade de condições para os praticantes em todo o mundo. Sob essa ótica, os esports não se encaixam,” explica.
“No entanto, desde os anos 2000, a definição de esporte vem se transformando. Hoje, considera-se esporte qualquer atividade organizada com regras conhecidas e que envolva preparo físico e mental. Nesse sentido, os esports poderiam ser classificados como esportes. Mesmo na academia, não há consenso, pois o mundo está em constante mudança. A inclusão dos esports no sistema esportivo e olímpico pode ser apenas uma questão de tempo,” conclui Rocco Júnior.
O doutor em Educação Física Leandro Carlos Mazzei, da Unicamp, aborda os esports sob três perspectivas:
“Do ponto de vista sociológico, os esports são um fenômeno da sociedade pós-industrial, diferente dos esportes tradicionais. Compará-los diretamente pode ser um erro, pois são vividos por gerações diferentes.”
“Na perspectiva do esporte moderno, baseada na sociedade industrial, os esports podem ser classificados como esporte. Atletas de ambos os campos têm rotinas semelhantes.”
“Em termos de políticas públicas, o esporte tradicional enfrenta desafios de acessibilidade, com muitas escolas carecendo de instalações esportivas. Ana Moser defende a prioridade para o esporte tradicional, visando a formação e a saúde dos indivíduos. Incluir os esports neste contexto pode ser problemático, pois eles necessitam de infraestrutura tecnológica diferente.”
Mazzei também destaca que os esports não dependem de federações para existirem. “Os torneios são organizados por entidades independentes ou pelas próprias desenvolvedoras dos jogos, que detêm a propriedade intelectual.”
Ele argumenta que, por se desenvolverem de forma independente, talvez não haja necessidade de investimento público nos esports. “Jogos eletrônicos já estão sendo reconhecidos por entidades olímpicas, especialmente aqueles ligados a esportes tradicionais, como simuladores de futebol e basquete.”
O médico do esporte Roberto Nahon, diretor da Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício e do Esporte e ex-médico-chefe do COB, observa que a definição do que é ou não esporte é uma convenção social. Ele reconhece argumentos válidos em ambas as perspectivas – considerar ou não os esports como esporte, tendo a atividade física como base de análise – mas prefere a ideia de que o esporte envolve treinamento para alcançar alta performance, o que incluiria os campeonatos de games.
Nahon ressalta que, do ponto de vista da saúde, praticar uma modalidade esportiva que envolva atividade física é claramente mais benéfico do que uma que não envolva. No entanto, ele também destaca que jogadores profissionais de esports precisam de preparo físico, mesmo que não seja o principal fator para seu desempenho.
“Sem dúvida, é mais saudável praticar atividade física do que não praticar, mas como atividade social, a competição de esports é saudável. A atividade física pode complementar, pois melhora a performance. Tenho jogadores de xadrez e de esports como pacientes e prescrevo atividades físicas para eles, tanto para aliviar a tensão quanto para evitar dores causadas pelo tempo prolongado sentado,” exemplifica Nahon, mencionando que os esports têm sido tema de discussão em congressos de medicina esportiva.
Daniel Orlean, gestor que liderou a entrada do Flamengo nos esports em 2017, vê os esports como esportes, mas considera normal a resistência inicial, dado que a competição via games ainda é um fenômeno recente.
“O uso de programas de computador com mecânicas gamificadas, ou games, não tira o caráter esportivo dos esports. Pelo contrário, eles são a evolução do esporte. Incorporam competitividade, regras e objetivos bem definidos para superar adversários. É um debate empolgante, mas deve ser abordado com mente e coração abertos, não com afirmações categóricas.
Acredito que a ministra, sendo um exemplo em seu setor, abrirá espaço para essa discussão. É normal, no início de qualquer nova trajetória – e os esportes eletrônicos, apesar do sucesso, ainda estão nessa fase – haver resistência por parte dos grandes e consagrados do setor,” conclui Orlean.
O que dizem os estudos
Estudiosos de todo o mundo têm se debruçado sobre a definição acadêmica dos esportes eletrônicos, mas o consenso ainda é distante. Alguns usam o conceito de esporte para explicar as competições de games, enquanto outros acreditam que essas disputas não são propriamente esportes, ou pelo menos, não são reconhecidas como tal pela sociedade.
O pesquisador sueco Oscar Bornemark investigou as características que qualificam um game como esporte eletrônico, sugerindo que o investimento da empresa proprietária do jogo é crucial.
Ele define esports como “um termo genérico para descrever o ato de jogar videogame competitivamente”. Emma Witkowski, pesquisadora e professora australiana, descreve esports como “uma abordagem organizada e competitiva de jogar games de computador”.
Uma definição frequentemente citada na academia é a de Michael G. Wagner, que se baseia na descrição de esporte do cientista alemão Claus Tiedemann. Wagner propõe que os esports são “uma área das atividades esportivas onde as pessoas desenvolvem e treinam habilidades mentais ou físicas no uso de tecnologias de informação e comunicação”.
No entanto, ele ressalta que os esports devem ser entendidos como um campo de estudo distinto e não necessariamente contidos na definição clássica de esporte, defendendo a criação de uma “ciência dos esports”.
Pesquisadores finlandeses, Juho Hamari e Max Sjöblom, observam que, nos esportes tradicionais, as atividades e resultados ocorrem no “mundo real”, ainda que possam utilizar sistemas eletrônicos para assistência.
Em contrapartida, nos esports, a ação se desenrola em ambientes digitais. Para eles, esports são “uma forma de esporte em que os aspectos primários são facilitados por sistemas eletrônicos”.
O filósofo finlandês Veli-Matti Karhulahti analisa os jogos eletrônicos competitivos sob uma perspectiva econômica, lembrando que os games são produtos comerciais desenvolvidos para gerar lucro.
Diferente dos esportes tradicionais, os esports são parte de sistemas projetados comercialmente, controlados pelas empresas desenvolvedoras, que podem modificar os jogos conforme necessário.
Um artigo dos pesquisadores Seth Jenny, R. Douglas Manning, Margaret Keiper e Tracy Olrich compara os aspectos dos esports com os esportes tradicionais, destacando que esports “incluem jogo e competição, são organizados por regras, exigem habilidade e têm muitos seguidores”, mas atualmente carecem de grande aspecto físico e institucionalização.
Os pesquisadores sugerem que videogames baseados em movimento, que utilizem alto nível de atividade física, poderiam futuramente credenciar os esports como esportes reconhecidos pela população. Eles concluem que, embora os sinais sejam promissores, é necessário mais tempo para demonstrar que os esports são estáveis e institucionalizados.
“Um refinamento da definição de esporte, ou o uso de videogames baseados em movimento, precisará ocorrer antes que os esports sejam totalmente aceitos como versões autênticas do esporte pela maioria da sociedade,” afirmam no estudo.
O E-sports é para quem?
Os esportes eletrônicos, ou e-sports, têm ganhado uma popularidade impressionante ao redor do mundo. Mas quem exatamente compõe o público dos e-sports? Vamos explorar quem são os principais envolvidos e como diferentes grupos encontram seu lugar nesse universo vibrante.
Gamers de Todas as Idades
Ao contrário do que muitos podem pensar, o público dos e-sports não é composto apenas por jovens. Enquanto a maioria dos jogadores e espectadores são adolescentes e jovens adultos, pessoas de todas as idades participam dessa comunidade.
Desde crianças que começam a se interessar por jogos até adultos que encontram nos e-sports uma forma de relaxar e competir, a faixa etária é bastante diversa.
Profissionais e Aspirantes
Os e-sports oferecem uma carreira lucrativa para jogadores talentosos. Profissionais que se destacam em jogos como League of Legends, Dota 2, CSe Fortnite podem ganhar prêmios substanciais em torneios, além de patrocínios e contratos com equipes de renome.
No entanto, não são apenas os jogadores profissionais que têm um lugar nesse mundo. Muitos aspirantes investem tempo e esforço para aprimorar suas habilidades na esperança de um dia se tornarem profissionais.
Entusiastas e Espectadores
Nem todos que estão envolvidos com e-sports jogam ativamente. Muitos são entusiastas que acompanham os torneios, seguem seus jogadores favoritos e participam de comunidades online.
Plataformas como Twitch e YouTube são populares entre esses espectadores, que assistem a transmissões ao vivo, comentam e torcem por suas equipes preferidas. Esses fãs são cruciais para a indústria, pois impulsionam a audiência e atraem patrocinadores.
Desenvolvedores e Organizadores
Outro grupo importante são os desenvolvedores de jogos e organizadores de torneios. Empresas que criam jogos populares investem pesadamente no desenvolvimento de e-sports, criando competições oficiais e promovendo seus títulos como plataformas de esportes eletrônicos.
Organizadores de torneios desempenham um papel vital, coordenando eventos, estabelecendo regras e assegurando que as competições sejam justas e emocionantes.
Educadores e Pesquisadores
Os e-sports também têm atraído a atenção de educadores e pesquisadores. Instituições acadêmicas estão começando a oferecer cursos e programas focados em e-sports, cobrindo desde a gestão de equipes até o desenvolvimento de jogos.
Pesquisadores estudam os impactos psicológicos e sociais dos e-sports, explorando temas como saúde mental, habilidades cognitivas e trabalho em equipe.
Pais e Famílias
Com a crescente popularidade dos e-sports, muitos pais estão se tornando mais envolvidos no mundo dos jogos, tanto para entender melhor as atividades de seus filhos quanto para compartilhar momentos de lazer.
Alguns pais apoiam ativamente os sonhos de seus filhos de se tornarem jogadores profissionais, enquanto outros incentivam o equilíbrio entre os jogos e outras responsabilidades.
Os benefícios do E-sports para as pessoas
Os esportes eletrônicos, ou e-sports, têm se tornado uma parte significativa da cultura moderna, atraindo milhões de jogadores e espectadores ao redor do mundo. Além do entretenimento, os e-sports oferecem uma série de benefícios que impactam positivamente a vida das pessoas. Vamos explorar alguns desses benefícios.
Desenvolvimento de Habilidades
1. Coordenação Motora e Reflexos: Jogar e-sports exige uma coordenação motora fina e reflexos rápidos. Jogadores precisam reagir em frações de segundo, o que pode melhorar a agilidade e a precisão dos movimentos.
2. Habilidades Cognitivas: E-sports estimulam o cérebro de várias maneiras. Estratégia, tomada de decisões rápidas, resolução de problemas e planejamento são habilidades constantemente usadas em jogos competitivos. Isso pode levar a uma melhoria na capacidade cognitiva geral.
3. Trabalho em Equipe e Comunicação: Muitos jogos de e-sports são baseados em equipes, exigindo comunicação eficaz e colaboração. Jogadores aprendem a trabalhar juntos, a compartilhar informações rapidamente e a confiar nos seus companheiros, habilidades valiosas tanto no jogo quanto na vida real.
Benefícios Sociais
1. Comunidade e Pertencimento: E-sports criam comunidades vibrantes onde pessoas com interesses comuns podem se encontrar, seja online ou em eventos presenciais. Isso promove um senso de pertencimento e amizade entre os jogadores.
2. Inclusão e Diversidade: Os e-sports atraem pessoas de todas as idades, gêneros e origens. Esta diversidade é um ponto forte, permitindo que indivíduos de diferentes culturas e experiências se conectem e aprendam uns com os outros.
Impactos na Saúde Mental
1. Redução do Estresse: Jogar pode ser uma forma eficaz de aliviar o estresse. O engajamento nos jogos pode servir como uma pausa necessária da rotina diária, ajudando a relaxar e a descomprimir.
2. Autoestima e Realização: Competir e melhorar em e-sports pode aumentar a autoestima. Conseguir vencer jogos, subir em rankings e ganhar torneios oferece uma sensação de realização e orgulho.
Oportunidades de Carreira
1. Profissionalização: O cenário dos e-sports oferece carreiras lucrativas para jogadores profissionais. Além dos prêmios em dinheiro, jogadores podem conseguir patrocínios e contratos com equipes.
2. Indústria de Apoio: Além dos jogadores, os e-sports geram oportunidades em áreas como desenvolvimento de jogos, gestão de equipes, organização de eventos, transmissão ao vivo, e até mesmo jornalismo de e-sports. Isso abre um leque de opções de carreira para os entusiastas dos jogos.
Educação e Pesquisa
1. Programas Educacionais: Muitas instituições educacionais estão começando a oferecer cursos relacionados a e-sports. Isso inclui desde a gestão de equipes até o desenvolvimento de jogos e a psicologia do esporte.
2. Pesquisa Acadêmica: Pesquisadores estão estudando os efeitos dos e-sports em várias áreas, incluindo saúde mental, habilidades cognitivas e sociais. Estes estudos ajudam a entender melhor o impacto dos jogos na sociedade e podem levar a novas descobertas e práticas.
Conclusão
Os e-sports vão além do entretenimento, oferecendo uma gama de benefícios que vão desde o desenvolvimento de habilidades cognitivas e motoras até a criação de oportunidades de carreira. Eles promovem a inclusão social, a redução do estresse e o senso de comunidade.
Com o crescimento contínuo dos e-sports, seus impactos positivos na vida das pessoas só tendem a aumentar, tornando-os uma parte valiosa e significativa da cultura moderna.